O
envelhecimento é um processo fisiológico que
acarreta inúmeras mudanças no organismo e
impacta diretamente no desempenho de funções
cognitivas, psicológicas, sensoriais e
biológicas que interferem na qualidade de
vida do indivíduo. De acordo com a
Organização Mundial de Saúde (OMS) uma
pessoa é considerada idosa a partir dos 60
anos ou mais. No Brasil, este grupo ocupa
cerca de 13% da população, com a tendência
de aumentar drasticamente nos próximos anos
[1].
Os avanços
tecnológicos e científicos na saúde
contribuem diretamente para a melhoria da
qualidade de vida e, consequentemente, no
aumento da longevidade. Devido ao crescente
número de idosos na população mundial, houve
também, um aumento na prevalência de agravos
associados a esta faixa etária, como doenças
crônicas e incapacidades funcionais. Entre
essas doenças, a demência é particularmente
preocupante, afetando cerca de 8,5% dos
idosos no Brasil. Atualmente, estima-se que
cerca de 2 milhões de pessoas no país vivam
com demência, sendo a maior parte dos casos
em estágio moderado ou avançado [1-3]. A
demência engloba uma série de síndromes que
são caracterizadas por uma doença
neurodegenerativa que promove alterações na
cognição, memória e no comportamento do
indivíduo. Ela é considerada uma doença de
curso lento e progressivo, apresentando
sintomas como perda de memória, confusão,
estresse, depressão, problemas na fala e
redução da autonomia. Conforme a doença
avança, há uma diminuição exponencial das
funções cognitivas, o que compromete a
capacidade do indivíduo de reconhecer e
comunicar a dor de forma coerente,
dificultando o seu manejo nesse grupo, visto
que o padrão ouro para a identificação da
dor é o autorrelato [1-6].
Considera-se
que, mais da metade dos pacientes com
demência, experienciam dor regularmente.
Entretanto, seu reconhecimento e tratamento
são frequentemente prejudicados pela
dificuldade de comunicação desses indivíduos
e pela falta de treinamento e conhecimento
dos cuidadores e familiares acerca da
maneira correta de realizar essa tarefa. O
tratamento inadequado da dor, está associado
a um maior declínio da memória, dificuldades
no sono, perda de apetite e delírio, os
quais podem contribuir negativamente para o
avanço da demência e da qualidade de vida
desses idosos [6]. Para proporcionar um
manejo analgésico adequado nas pessoas com
demência, é fundamental que os responsáveis
pelos cuidados, sejam familiares ou
profissionais de saúde, tenham um olhar
atento e diferenciado para possíveis sinais
de dor.
Diferentes
abordagens podem ser utilizadas para
reconhecer sinais e sintomas da dor nesse
grupo de pacientes. A utilização de escalas
de dor, que levam em consideração mudanças
no comportamento e na expressão facial, se
constitui como uma grande aliada no
reconhecimento e rastreamento da dor em
pessoas no estágio da demência nos quais a
verbalização está prejudicada. O
estreitamento do olhar, abertura da boca,
verbalização de gemidos, recusa em se
movimentar, postura curvada e modificações
nas interações sociais, bem como o
acompanhamento de alterações de sinais
vitais como, temperatura, pressão,
frequência respiratória e cardíaca também
são bons indicadores [6-12].
A Escala de
Avaliação de Dor na Demência Avançada (PAINAD),
é uma ferramenta bastante consolidada que se
baseia na observação do indivíduo, avaliando
cinco parâmetros: respiração, vocalização
negativa, expressão facial, linguagem
corporal e consolabilidade [7,9,11]. Cada
item recebe uma pontuação entre 0 e 2, no
qual o 0 indica que não há alteração, o 1, o
indivíduo demonstra uma alteração moderada
ou esporádica e o 2 uma alteração grave e
intensa [13]. Ao final, a pontuação é somada
com o objetivo de classificar a dor entre
inexistente, leve, moderada ou forte
[7,8,13]. Devido ao seu design simplificado
e objetivo, essa escala pode ser facilmente
aplicada tanto por cuidadores quanto por
familiares que não possuem um treinamento
especializado, facilitando o manejo da dor.
Na última
década, diversas escalas e instrumentos
foram desenvolvidos com a finalidade de
reconhecer e rastrear a dor em pessoas com
demência. No entretanto, sua aplicação ainda
é limitada, seja pela falta de conhecimento
e de treinamento dos profissionais e
cuidadores, seja pela complexidade de uso
desses métodos, fazendo com que essa
combinação de fatores dificulte sua
utilização de forma efetiva. Embora,
reconhecer a dor em pessoas vivendo com
demência possa parecer uma tarefa difícil e
trabalhosa, seu rastreamento é essencial
para proporcionar um tratamento adequado e
uma melhor qualidade de vida para estes
indivíduos.
Referências:
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narrativa.
[3]
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sobre a Demência estima que cerca de
8,5% da população idosa convive com a
doença. Gov.br. Atualizado em set 21,
2024.
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/relatorio-nacional-sobre-a-demencia-estima-que-cerca-de-8-5-da-populacao-idosa-convive-com-a-doenca
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* Aluna de
graduação – iniciação científica/extensão
UFBA