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Editorial do mês

 

 

O que é paquioníquia congênita e qual sua relação com a dor?
Dhara Leite Lopes * e Cristiane Flora Villarreal **

 

A paquioníquia congênita (PC) é uma doença genética rara causada por uma mutação em um dos cinco genes da queratina: KRT6A, KRT6B, KRT6C, KRT16 ou KRT17 (PC Project, 2024). Os diferentes tipos de PC são classificados como PC-K6a, PC-K6b, PC-K6c, PC-K16 e PC-K17, de acordo com o gene onde a mutação está localizada. O gene específico e a mutação envolvidos afetam a condição clínica da doença do paciente com PC. Os genes da queratina são responsáveis pela produção de queratinas, que são proteínas fibrosas e resistentes cuja função é sustentar as células da pele. Dessa forma, a queratina dá firmeza, elasticidade e resistência para nossa pele (Wu, 2021). Na PC, a queratina não se forma adequadamente, ocasionando sintomas como unhas espessas, calos dolorosos e bolhas nos pés, cistos, hiperqueratose folicular (protuberância no folículo), leucoceratose da mucosa oral (película branca na língua e no interior das bochechas) e coceira profunda (Samuel et al., 2020).

 

Segundo o PC Project (2024), um projeto inteiramente voltado para o estudo e difusão de informações sobre a paquioníquia congênita, esta doença não afeta a expectativa de vida, mas quase todos os pacientes apresentam dores crônicas que dificultam, e às vezes impossibilitam, a marcha. Assim, a dor é um sintoma importante na PC, embora sua gravidade e tipos sejam ainda mal caracterizados. Em portadores de PC a dor é normalmente relacionada a presença de calos dolorosos e bolhas, mas um estudo clínico publicado em 2016 evidenciou que a dor neuropática, que tem origem em lesões dos nervos, também pode ser prevalente nesses pacientes. Wallis, Poole e Hoggart (2016) investigaram se a PC pode causar dor neuropática. Para isso, avaliaram 35 pacientes norte-americanos diagnosticados com PC e aplicaram questionários para avaliação da qualidade de vida (EQ-5D 3L) e de dor (Brief Pain Inventory e painDETECT). Também fizeram testes sensoriais quantitativos que incluíram avaliação dos limiares de detecção e de dor para estímulo mecânico e a detecção de vibração. Os resultados confirmaram dor significativa em 64% dos pacientes do estudo, bem como comprometimento da qualidade de vida. Os resultados dos questionários e dos testes sensoriais quantitativos indicaram que a dor neuropática estava presente em 62% dos pacientes. Este estudo indicou que as dores crônicas que acometem pacientes com PC podem ser do tipo nociceptivo e do tipo neuropático. Esse achado tem impacto direto sobre as estratégias terapêuticas, considerando que a dor neuropática é controlada com analgésicos diferentes daqueles usados para dor nociceptiva.

 

Até o atual momento não há cura ou tratamento específico para a PC. Os tratamentos atuais são limitados a medidas conservadoras para reduzir o atrito e o trauma plantar, desbridamento mecânico, tratamentos tópicos e tratamentos para complicações associadas, mais comumente infecções (Mccarthy, 2023). Alguns ensaios clínicos estão em andamento, como um estudo com a pomada de erlotinibe que está sendo investigada quanto à eficácia na PC. A segurança e eficácia de um creme tópico de KM001, uma molécula que atua como inibidor de TRPV3 - canais iônicos que contribuem para o desenvolvimento de ceratodermia e coceira – também está sendo avaliada em pacientes com PC. Entretanto, a eficácia desses tratamentos ainda não foi estabelecida.

 

Assim, até que existam tratamentos aprovados e eficazes, que proporcionem benefícios a longo prazo, os portadores de PC precisam aprender as melhores formas de minimizar os impactos dolorosos e negativos da paquioníquia congênita. Entre as estratégias estão: diminuir, até certo limite, as calosidades por desbridamento; usar sapatos confortáveis; usar palmilhas; manter boa hidratação dos pés para evitar rachaduras; e evitar atividades que causem dor, como caminhadas longas, corrida, dança e atividades físicas que causam impacto nos pés. Essas medidas podem reduzir a frequência, severidade e o nível de incapacidade causada pela dor e seu impacto negativo na qualidade de vida de portadores de PC.

 

Referências:

  • Mccarthy RL, De Brito M, O'Toole E. Pachyonychia Congenita: Clinical Features and Future Treatments. Keio J Med. Published online September 28, 2023. doi:10.2302/kjm.2023-0012-IR

  • PC Project. What Is Pachyonychia Congenita? Pachyonychia Congenita Research & Patient Support Project. Disponível em: https://www.pachyonychia.org/what-is-pc/. Acesso em: 16 mai. 2024.

  • Samuel L, Smith JD, Hansen CD, Sprecher E. Revisiting pachyonychia congenita: a case-cohort study of 815 patients. Br J Dermatol. 2020;182(3):738-746. doi:10.1111/bjd.18794

  • Wallis T, Poole CD, Hoggart B. Can skin disease cause neuropathic pain? A study in pachyonychia congenita. Clin Exp Dermatol. 2016;41(1):26-33. doi:10.1111/ced.12723

  • Wu TT, Eldirene SA, Bunick CG, Teng JMC. Genotype‒Structure Type‒Phenotype Correlations in Patients with Pachyonychia Congenita. J Invest Dermatol. 2021;141(12):2876-2884.e4. doi:10.1016/j.jid.2021.03.035


* Aluna de doutorado - UFBA

** Professora Associada - UFBA